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Artigo – Mudanças (infelizes) no CTB

 

 

J. Pedro Corrêa aborda as mudanças no CTB que entram em vigor agora em abril e o desapontamento que provocaram na comunidade do trânsito. 

*J. Pedro Corrêa

 

Neste 12 de abril entram em vigor novas alterações do Código de Trânsito Brasileiro propostas pelo Presidente da República e aprovadas, com ressalvas, pelo Congresso Nacional. É a 39ª mexida no Código, em vigor desde janeiro de 1998, que desta vez cobre 57 modificações, o que não é pouca coisa.

Na opinião generalizada de especialistas em legislação de trânsito, pelo conjunto das mudanças, o Código muda para pior mas teria ficado ainda mais complicado se todas as mudanças tivessem sido aprovadas.

Várias alterações aprovadas facilitam a vida dos infratores e daqueles que querem infringir as normas de segurança e não acrescentam pontos importantes para a segurança do trânsito. Outras tangenciam a segurança ao passo que algumas ficam no terreno da perfumaria. Há algumas que são simplesmente para inglês ver, como a do Conselho Nacional de Trânsito.

Defensores da Lei, na verdade, mostram até uma certa satisfação com o resultado final, pois algumas propostas que faziam parte do pacote inicial, foram, felizmente rejeitadas pelos parlamentares, depois de ouvida a comunidade do trânsito. Alguns técnicos chegaram a me dizer que “as mudanças que chegam em abril valem mais pelo que foi vetado do que pelo que foi aprovado”.

Enfim, para quem trabalha pela segurança no trânsito, não há como não ficar desapontado.

Nos 4 cantos do país sempre ouço que nosso Código é muito bom, “um dos melhores do mundo”. Ocorre que nossa fiscalização é falha e isto tira o brilho do documento. Apesar de ter mais de 20 anos, o CTB ainda possui artigos que ainda não foram implementados por completo e isto envia sinais confusos para a sociedade. Como se não bastasse, o próprio governo altera o que estava valendo com medidas que pouco ou nada contribuem para tornar nosso trânsito mais ordeiro ou mais seguro. Exemplos: aumentar o prazo de validade da CNH ou ampliar a pontuação no prontuário do motorista significam um afrouxamento sem a menor justificativa.

Nos países mais desenvolvidos há um rigor bastante forte na aprovação do candidato a motorista; uma vez aprovado no exame e de posse de sua permissão para dirigir (veja, é uma PERMISSÃO), a rigidez no controle do seu comportamento no trânsito é enorme e a polícia é implacável caso ele burle as regras. E isto tudo é feito em nome da segurança sua e da sociedade.

Com um detalhe adicional e importantíssimo: com a aprovação integral e inequívoca da sociedade.

Tenho certeza de que, se fizéssemos uma ampla e profunda pesquisa de opinião pública junto à sociedade brasileira perguntando como gostaria que fossem tratados os infratores das leis de trânsito, não tenho a menor dúvida de que a resposta seria: punição justa. Afinal, ela sabe o que é chorar mais de 30/40.000 vezes por ano pelas mortes desnecessárias nas ruas e estradas do país.

Não será com populismo, com promessas de campanhas que pouco ou nada contribuem para o bem-estar, para melhorar a autoestima da sociedade, que vamos chegar um dia a ter um trânsito ordeiro, humano e digno das nossas ambições.

Os países mais adiantados mostram há décadas qual o caminho do trânsito seguro: engenharia de tráfego comprometida com a segurança, boa formação de condutores e fiscalização ostensiva de suas ações nas ruas e estradas. O rigor da lei vale para todos. Está claro que, o que garante a prática da infração é a certeza da impunidade e o Brasil já ultrapassou seus limites de tolerância neste quesito.

A sociedade precisa exercer seu direito de alterar o rumo das coisas no trânsito e exigir comportamento de país sério onde a vida tem valor e não pode continuar a ser banalizada da forma como tem sido.

Como sociedade, precisamos aprender a usar melhor os canais de contato com o poder para pressionar por um trânsito melhor, com menos jeitinhos e mais seriedade, onde cuidar de si não significa apenas proteção pessoal, mas principalmente cuidar também dos demais usuários. Isto é respeitar a vida, exercer a civilidade.


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Por tudo isto é que não posso aceitar 57 modificações no Código de Trânsito onde pouca delas apoiam maior rigor na segurança, pelo contrário afrouxam o que já não era bem fiscalizado. Enquanto isto, continuamos com nossos milhares de mortos, sem programa de prevenção nem campanhas de conscientização da sociedade.

Já passamos da metade do período da gestão do atual governo e até agora o Pnatrans, programa de prevenção de mortes e lesões no trânsito, ainda não decolou para valer, mas mudanças no CTB já aconteceram em grande número.

Começou a 2ª Década Mundial de Ações de Trânsito, da ONU e OMS, mas ainda vimos o gesto público do Governo dizendo o que pretende fazer para mostrar seu alinhamento com os objetivos globais. Assim, fica difícil de acreditar em resultados positivos sensíveis até o final desta gestão. A exceção talvez fique por conta de trabalhos no domínio do Ministério da Infraestrutura com um programa de melhoria de segurança das rodovias federais. Oxalá produzam os resultados esperados.

Diante de tal quadro o que resta fazer ao simples cidadão brasileiro?

Exercitar sua cidadania e pressionar os políticos nos quais votou e acreditou por um trânsito melhor. No âmbito das cidades há medidas que podem ser acionadas e que podem ajudar: cuidar melhor de si próprio e dos seus, pressionar por mais fiscalização, sugerir correções de pontos críticos onde acidentes se repetem, incentivar os meios de comunicação e a própria mídia social a se engajar ainda mais no debate público das questões de trânsito. Isto não tem qualquer custo, mas pode fazer a diferença.

Na página 186 do meu livro Cultura de Segurança no Trânsito – Casos Brasileiros, na abertura do capítulo 7, dedicado à sociedade, uso uma frase do pastor religioso norte-americano Peter Marshal que tenho repetido exaustivamente:

“Um mundo diferente não pode ser construído por pessoas indiferentes”!

Como eu sonho com o dia em que esta indiferença brasileira chegue ao fim e que assumamos, finalmente, o comando do nosso próprio destino!

*J. Pedro Corrêa é Consultor em Programas de Segurança no Trânsito

 

 

Fonte: Portal do Trânsito